Ficara pensando em que os outros imaginavam dele, naquele momento, principalmente os que cruzavam os olhos nos seus. Isso porque sentia-se como um borrão, um volto impessoal, do qual daqui a 22 segundo não seria mais lembrado. Como aquele bip que já durava 12 segundos e nada... “Será que só ele que ouvia?”.
O senhorzinho sentado no banco a frente, no lado esquerdo, nem o notara, deveria estar mais preocupado com suas dores nas costas, sofridas graças aos setenta anos vividos, pelos menos.
A garganta contraindo e expandido da jovem senhora mostrara que a degustação de sua água sem gás (apesar do gosto da água ser uma dos seus maiores enigmas) e a refrescância que ela proporcionava, indicava que o calor era mais incomodante do que aquele maldito bip que à 18 segundos atormentava a sua mente. Talvez dois ou três bips por segundo, pelo menos 36 bips até aquele ponto.
Nesse instante do seu pensamento é que ele olha a sua direita e um pouco mais a frente e seu coração acelerasse, aumentando os seus batimentos e a força da pulsação do sangue pelo corpo, seguido por uma descarga espontânea de adrenalina e... num estado que faria gravar aqueles cinquenta e oito centésimos de segundos pelo resto de sua vida... todas essas reações em conseqüência do encontro de olhar mais longo da viagem. E o fato que mais o agradara era que aquela linda morena já o fitava por pelo menos dois segundos. Claro que ela desviou o olhar depois dos cinquenta e oito centésimos de segundo, e assim ele aproveitou a oportunidade para percorrer o corpo todo daquela criatura cândida e angelical.
Nem percebeu que o bip havia desaparecido no ar, pois acordou o rapaz sentado atrás que desligou o despertador, no exato momento em que o metrô chegou a estação Barra Funda, qual todos iriam desembarcar, estação final da viagem, aonde sumiu em meio a multidão aquela morena linda que nunca mais viria na sua vida.